domingo, 16 de fevereiro de 2014

Breaker - Accept

O terceiro disco da banda de Heavy Metal alemã Accept, Breaker, foi lançado em 16 de março de 1982. É responsável por mostrar um novo direcionamento do conjunto.
Durante as revoluções globais que assolavam o cotidiano do planeta em suas diversas vertentes por volta dos anos trinta (social e econômica, principalmente), Adolf Hitler discursava para a juventude alemã, oprimida pela palavra de ordem já regida desde a Primeira Guerra Mundial pelos países dominantes europeus (ver os livros A Revolução Alemã 1890 a 1915 e O Último Verão Da Europa para mais detalhes) com o intuito de levantar o ânimo de sua população para uma eventual batalha em prol de seus interesses. Em sua postura firme, indubitável e amplamente convincente, o Führer domava multidões apenas com as suas palavras, fazendo do verbo sua mais mortífera arma. Contudo, mesmo se tivesse a oportunidade de ver o desfecho trágico de suas ações (digo, até o final, já que o mesmo cometera suicídio em 1945 justamente temendo ser capturado pelas tropas aliadas ao fim da Segunda Guerra Mundial), duvido que sentiria orgulho delas (para não desviar o foco não vamos aprofundar-nos no holocausto), pois sua pátria, juntamente com seu povo, viu os anos compreendidos entre o fim de 1940 a 1970 massacrarem todo aquele sentimento de união e luta que o mesmo propagara em suas inflamadas audiências. O país foi dividido em dois pelas nações vitoriosas, sendo uma parte capitalista e outra socialista, através da vergonhosa Cortina de Ferro (fisicamente representada por um muro de concreto conhecido pelos alemães como Mauer, com obras iniciadas em 13 de Agosto de 1961 que, num ato de total esquizofrenia geopolítica, separava a Alemanha em duas partes), cada qual propagando suas próprias leis de conduta, sustento e progresso, segundo seu regimento político.
Devido a grande massificação consumista elaborada pelos países aliados após a segunda guerra mundial, o “lado capitalista do muro” desenvolveu-se agregando as características socioculturais das nações de ampla ascensão econômica (França, EUA e reino Unido), sendo este um fator decisivo para o surgimento de movimentos sociais populares, que tinham como intuito propagar o crescimento da identidade alemã em relação ao resto do mundo. Sob um panorama geral, cada país possuía sua cultura, sua forma de expressão, sendo esta uma ferramenta particular para a prática da autoafirmação, a qual a Alemanha, mesmo desmembrada, não recusara. Durante os primeiros anos de 1980, com o enfraquecimento da Guerra Fria (isto é, se relacionarmos tal período ao de seu início, na segunda metade de 1940) a Alemanha passou a desenvolver com mais afinco seu lado cultural, contribuindo para resultados grandiosos ao fim desta mesma década, com a queda do muro de Berlim e a consolidação de uma única nação novamente.
Com foco nesta revolução que ocorreu há pouco mais de trinta anos, vale destacar o âmbito musical que germinava na Alemanha desde a primeira metade dos anos sessenta aos setenta, onde alguns nomes de bandas hoje mundialmente conhecidas (LUCIFER´S FRIEND, TANGERINE DREAM e SCORPIONS só para citar algumas) davam seus primeiros passos. A chegada dos anos oitenta apresentou para o mundo a explosão selvagem do Punk Rock e do Heavy Metal, e nesse cenário de ebulição sonora um grupo oriundo de Solingen, North Rhine-Westphalia (ao norte da Alemanha) buscava sua afirmação. O ACCEPT, que contava com dois álbuns de estúdio já lançados, algumas boas turnês sob o solo da própria pátria e uma semelhança incrível com o seminal AC/ DC (principalmente na postura) estava disposto a provar, desta vez em maior escala, seu propósito e suas ambições.
O disco foi gravado no Delta Studio em Wilster, ao norte da Alemanha, entre os meses de dezembro de 1981 e janeiro de 1982. Foi produzido por Dirk Steffens.
O disco de 1980, I’M A REBEL, mostrava uma mistura de Hard Rock com Heavy Metal que desembocava numa sonoridade crua, mas trabalhada, com direito a passagens criativas e empolgantes (vide as canções THUNDER AND LIGHTNING e SAVE US), o que deixava claro que a química do conjunto acabaria rendendo bons trabalhos mais adiante. Naquela época, o conjunto tinha nas notas precisas do guitarrista Wolf Hoffmann e no baixo seguro de Peter Baltes sua arma para empolgar as multidões, mas quem chamava mesmo a atenção era o vocalista Udo Dirkschneider. Vestido em um par de calças aparatadas com lantejoulas enquanto exibia de sua camisa florida semiaberta uma forma arredondada, Udo era uma verdadeira alegoria dos palcos, que compensava sua baixa estatura inflamando as apresentações da banda com seu característico vocal anasalado e sua cabeleira loura a altura dos ombros, que brilhava ao compasso das luzes dos holofotes. Era impossível resistir a tamanho chamariz, sendo que o conjunto passou a acumular certa fama com o passar do tempo graças a essa combinação, que trazia cada vez mais pessoas para as apresentações do quinteto. Com um contrato assinado com a gravadora alemã Brain Records em 1981, a banda tinha em sua pauta o lançamento de mais um trabalho inédito. Porém, os cinco jovens, que acompanhavam de perto o crescimento da cena do Heavy Metal britânico tinham em mente algo mais orientado ao peso e melodia das guitarras, enquanto a bateria passaria a ter mais destaque acompanhando a sonoridade ríspida e contendo os impulsos desnecessários, algo tido como normal nas bandas iniciantes. Tendo isto em mente, os rapazes rumaram para o norte de sua pátria, mais precisamente para o distrito de Wilster, tendo como ponto final o Delta Studio, comandados pelo produtor Dirk Steffens. Munidos de acompanhamento empresarial e apoio da gravadora, algo até então inédito para o conjunto, o final de 1981 foi bastante agitado para a banda, com trabalhos intensos envolvendo a gravação e a produção do material que constituiria o terceiro disco de inéditas do ACCEPT.
Recordado entre dezembro de 1981 e janeiro de 1982, o disco BREAKER foi lançado dos meses após os registros, no dia 16 de março daquele ano. O título, ideal para a proposta do álbum, trazia aquela sensação de poder que o grupo tanto esbanjava em suas apresentações, mostrando uma fúria singular. Com ampla divulgação em solo alemão, o trabalho repercutiu bem entre os países europeus, trazendo para o conjunto uma fama internacional nunca antes vista, incendiando ainda mais a empolgante cena do Metal germânico. Se há alguns anos antes o SCORPIONS abriria as portas para um cenário fértil que apresentava os domínios alemães (com direito a alguns grupos locais conseguindo destaque mundo afora com canções executadas em sua própria língua), o ACCEPT sem dúvida merece alguma fatia do bolo em contribuir para esse processo.
A banda ganhou grande destaque por consequência das composições do álbum, principalmente pela faixa título, a música starlight e a polêmica canção son of a bitch, que teve a letra censurada pela imprensa alemã.
O figurino dos rapazes, antes extravagante, dava espaço para algo mais despojado, onde os jeans velhos e as jaquetas de couro com patches amplamente vistas na NWOBHM começavam a dar às caras no figurino juvenil da banda, substituindo a androgenia vista no início do grupo, no final da década de setenta. Nesse ponto, as casas de shows pareciam ficar cada vez mais cheias, enquanto o apelo sexual de Hoffmann entre as garotas nunca foi tão evidente como naquela época. A banda estava começando a atingir o auge, e o sabor do sucesso parecia viciar cada vez mais os rapazes alemães.
A trinca que abre o disco é uma clara demonstração do poder contido nas composições da banda, onde o início viciante de STARLIGHT mostra um degrau escalado pelo grupo em relação ao disco anterior. Com compasso firme, riff vigoroso e refrão forte e marcante, o trabalho da dupla de guitarras esbanja bom gosto, principalmente ao beber da fonte do JUDAS PRIEST, como demonstrado em diversos momentos do vinil. A faixa título é uma ode ao Heavy Metal, onde a letra faz chacoalhar a cabeça de qualquer metalhead enquanto embala as melodias extremamente bem dosadas, numa simbiose perfeita entre ritmo e composição. RUN IF YOU CAN traz auqela característica já herdada de Angus e seus comparsas, dividindo a canção entre algo contagiante e agressivo. Passando pela balada CAN’T STAND THE NIGHT que esfria a temperatura do disco, a quinta faixa é uma verdadeira afronta ao comportamento moderado da sociedade conservadora. A lenda reza que em um belo dia um amigo da banda surgiu para fazer uma visita aos rapazes no estúdio acompanhado de sua namorada, a qual era fluente em inglês e conhecia muitas gírias, sendo estas uma novidade bem vinda para os sempre curiosos garotos alemães. Entre uma conversa e outra, a jovem acabou por ensinar aos garotos coisas que não devia, como insultos e palavrões, que foram bem absorvidos pelo conjunto a ponto de se tornarem base para uma canção. Assim nasceu SON OF A BITCH com título explícito e sua obscena letra, que de tão imoral foi censurada nas prensagens alemãs, inclusive as mais recentes (a de 2000 pela Nuclear Blast e 2005 pela SPVGmbH).
Seguindo com BURNING (com um fundo falso para passar a sensação de que foi gravada ao vivo) e FEELINGS (levada bastante convincente e refrão pra lá de marcante) fica claro perceber como o conjunto trabalha como um time, onde o baixo de Peter se faz presente nas aparentes brechas deixadas entre os solos dobrados da dupla Wolf Hoffmann/ Jörg Fischer, enquanto o alcance vocal de Udo simplesmente detona, fazendo frente às batidas precisas de Stefan kaufmann. A canção MIDNIGHT HIGHWAY de certa forma empolga, sendo que a faixa BREAK UP AGAIN nos dá uma colher de chá ao mostrar Peter assumindo os vocais, coisa que ele já havia feito nos dois discos anteriores, deixando claro que suas virtudes vão além das quatro cordas. O final com DOWN AND OUT bota os ânimos pra cima, com uma apresentação irrepreensível da banda, como se estivesse executando a canção diante de uma plateia com milhares de fãs.
O álbum foi responsável pelo salto de popularidade da banda, permitindo ao conjunto sonhar com as grandes apresentações e uma possível turnê em escala continental.
O álbum evidentemente garantiu para o quinteto mais visibilidade no concorrido mercado musical da época, o que refletiu na turnê que se seguiu e na popularidade das canções STARLIGHT, BREAKER e SON OF A BITCH, executadas pelo conjunto até hoje. Já não era mais tão incomum passear pelas calçadas encardidas de qualquer grande metrópole europeia e encontrar nos pubs locais voltados para Heavy Metal rumores de uma nova banda alemã que estava fazendo barulho em sua terra natal. Coisas do mundo globalizado.
Apesar da aparente simplicidade, o caráter do grupo estava em estado de concepção, e o mundo veria surgir daquela aparente bizarrice que era o ACCEPT do fim dos anos setenta justamente a antítese do discurso nazista de Hitler, onde o homem que pregava a junção de princípios nacionalistas e socialistas como linha de frente contra a globalização certamente não poderia suportar a existência de indivíduos num mundo de particularidades culturais amplamente difusas, onde a liberdade e o conhecimento, amparados ao real senso de união derrotariam cabalmente suas ambições. Se lhe fosse permitida a possibilidade de vivenciar tal época, sem dúvida este seria seu inferno.
Trata-se de um clássico indiscutível do Heavy Metal mundial, sendo referência para diversos grupos e fãs.
Escrito em 16 de fevereiro de 2014 com início às 19hrs. e 15min.

Um comentário:

  1. Na minha versão desse álbum Breaker, a faixa "Breaking Up Again" não está inclusa.

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