O mais que famoso primeiro disco do Metallica, Kill 'Em All. |
Feliz o homem que foi o primeiro, o pioneiro, o desbravador!
A humanidade sempre precisou de indivíduos assim, desde os primórdios, aliás.
Foi assim quando o ser humano necessitou adaptar-se ao mundo em que vivia,
proporcionando a si mesmo ferramentas que facilitariam sua existência no
planeta. Vide o filme 2001: Uma Odisseia
No Espaço, de Stanley Kubrick. O
homem, em seu estado mais primitivo, ocupou-se de uma poça d’agua para seu bel
prazer e, para garantir que a mesma ficasse sob seu domínio, isto é, longe do
desejo dos demais, faz de um osso qualquer uma arma que garante sua proteção. O
filme, inclusive, mostra muito bem esse caráter do ser humano em adaptar-se ao
ambiente em que vive, e procura deixar clara a expansão que o homem sempre
aplicou em sua própria existência.
Imagina só qual não foi a sensação que o indivíduo que criou
a roda não sentiu! A ferramenta, tão comum nos dias atuais que até passa
despercebida no cotidiano, tornou possível todo o avanço do homem através dos
séculos. Para ter uma dimensão de sua importância, os veículos, as máquinas, e
os instrumentos de locomoção mecânica em geral não existiriam. Talvez até o bom
e sagrado futebol, esse mesmo que você acompanha agora na TV (nesse exato
momento o Brasil acaba de levar a virada da Inglaterra no amistoso do novo
Maracanã) não existisse sem a criação da roda que, no mais, ironicamente nunca
saberemos quem inventou. Uma obra-prima das mãos do homem, que ficará renegada
de seu maior patrimônio: o crédito do criador! Enquanto os ingleses podem se
gabar da façanha de ter inventado o esporte mais popular do mundo (e nesse
momento o Brasil empata com gol de Paulinho,
2 a 2) esta brilhante ideia que gira fica para o deleite de todos nós,
indivíduos do mundo contemporâneo. Não que a roda seja uma invenção moderna,
mas é inegável que desfrutaremos de suas funções para o resto de nossas
existências. Lembro bem de recentemente estar na companhia de um camarada e
discutir com ele a respeito destas coisas tão comuns que pouca gente sabe de
onde veio mas que ninguém vive sem, quando mencionei algo sobre Thomas Edison e a lâmpada elétrica.
Sempre fui contra esse globo de vidro chamar-se lâmpada por dois motivos: Pra
mim, lâmpada é a casa do Gênio, que diferente daquele de cor azul e
personalidade legal da Disney é um
demônio cruel aprisionado por conter terríveis poderes mágicos; segundo,
ninguém, ABSOLUTAMENTE NINGUÉM se lembra de Thomas
Edison quando acende ou apaga o interruptor! E lá se vai o legado de um
homem que dedicou SÓ uns 2/3 da sua vida para proporcionar aquela luz que,
durante a noite na minha época de garoto, enquanto morava no longínquo estado
do Pará, movia a debandada geral das pessoas para as calçadas, em frente de
casa mesmo, e seguiam-se horas e horas de piadas e histórias, contadas e recontadas
todas as vezes que tal fato ocorria. Ou até a energia voltar, e com a mesma
velocidade em que saíam de casa para ir de encontro dos vizinhos na rua todos
voltavam para o aconchego de seus lares para acompanhar o desfecho mais que
manjado da novela das oito.
Se o nome do tal globo de vidro fosse Thomas Edison, talvez essa injustiça não ocorresse. Mas, já que
discorri sobre coisas creditadas e não creditadas, falaremos de algo realmente
creditado, que se não criou aquilo do qual fez parte, sua contribuição é
inegável.
Era início dos anos oitenta quando, saído de sua ex-banda
intitulada LEATHER CHARM, o jovem James Hetfield atende a um comunicado
exposto em um jornal de São Francisco, colocado por um recém-chegado
dinamarquês na cidade americana. O sujeito, com sotaque em bastante evidência, pretendia
formar um grupo de Heavy Metal
fundamentado nas bandas as quais estava habituado a ouvir: o brilhantismo
britânico dos medalhões da NWOBHM. Já fazia alguns anos que bandas como SAXON, IRON MAIDEN e DIAMOND HEAD
permeavam a mente do jovem Lars Ulrich,
enquanto o mesmo empenhava-se em deixar a margem de fã para aventurar-se em uma
banda. O interesse que possuía por grupos de som pesado foi de encontro ao que Hetfield queria. Foi questão de tempo
até recrutarem o extrovertido baixista Ron
McGovney e o um irreverente e brincalhão Dave Mustaine... Esses eram os primeiros passos de um gigante de um
novo reino, prestes a germinar em um solo fértil cultivado pelo metal
britânico.
Antes, porém, era necessário escolher um nome. De classe
média-alta, filho de um já consagrado tenista dinamarquês, inclusive campeão da
modalidade, Lars possuía uma
capacidade ímpar de se relacionar com as pessoas. Dono de um charme totalmente
próprio, o jovem fazia amizades bem depressa, chagando inclusive a conviver com
a banda MOTÖRHEAD por um breve
período, condição que obteve após ganhar um concurso promovido pelo grupo. Uma
semana ao lado dos bastardos ingleses garantiu mais respeito para sua
reputação, a qual mantinha sempre em evidencia. Foi em um dia comum na
companhia de Ron Quintana, editor de
fanzines e promovente de um programa de rádio na estação KUSF intitulado Rampage, que Lars observou que o sujeito estava com uma lista curiosa de nomes,
os quais Quintana estava a fazer uma
preleção objetivando colocar um desses títulos no novo fanzine em que
trabalhava. Esperto, Lars sugeriu o
nome Metal Mania, logo depois de
convencer Quintana a descartar outro
nome mais sugestivo, talvez até mais apropriado para a ocasião... METALLICA. O resto é história!
Algumas demos
foram disponibilizadas neste início da banda, entre elas destaque para a
histórica NO LIFE ‘TIL LEATHER, gravada
e lançada em Julho de 1982 durante um show com o EXODUS, onde ocorreu uma situação que renderia discussões para os
próximos vinte anos, no mínimo. Fora o fato de terem chutado McGovney logo após acompanharem o
desempenho do hippie de cabelos vermelhos e calças largas, detentor das quatro
cordas da banda TRAUMA e atendendo
pelo nome de Cliff Burton, James e Lars tomaram uma atitude drástica: Impressionados pela técnica
apresentada pelo guitarrista do EXODUS,
o jovem Kirk Hammett, e ainda, extremamente
pilhados pelas bebedeiras intermináveis e sempre caóticas de Mustaine, a banda não pensou duas vezes em
demiti-lo. Só que o jovem de personalidade tempestuosa não digeriu bem a
decisão da dupla, iniciando uma guerra de ódio contra o METALLICA que duraria por anos, apaziguada apenas recentemente.
Discussões à parte, a formação estabilizou-se com Lars na bateria, seguido por Cliff
no baixo, enquanto Kirk e James dividiam as guitarras, com o
diferencial de que Hetfield segurava
todos os vocais. No início isso gerou certo desconforto, sendo que a banda
inclusive chegou a solicitar a adição de um vocalista. Jon Bush, do ARMORED SAINT,
foi cotado para o posto, havendo sido aprovado por Lars e James, contudo o
mesmo recusou o convite. Se soubesse no que aquilo tudo daria...
Passado algum tempo e, com a experiência acumulada de um ano
de apresentações, chegava o momento de lançar um full length. Contudo, mais problemas permearam o caminho da banda,
dessa vez pelo lado financeiro. Brian
Slagel, fundador do selo Metal Blade
e padrinho do grupo, não possuía condições financeiras para custear os oito mil
dólares que se faziam necessários para bancar o primeiro LP dos rapazes. Sendo
assim, os mesmos recorreram a Jon Zazula
e sua esposa, na esperança de conseguir o dinheiro. Após muitas reuniões com
gravadoras e muito vexame passado pelo casal diante dos mesmos, Jon decidiu fazer um empréstimo e
retirar o dinheiro por conta própria. Um risco que se fez necessário, ainda mais levando em conta o
potencial do grupo. Nascia assim o primeiro álbum da famosa cena Thrash Metal Bay Area, chamado de KILL ‘EM ALL.
O disco com seu encarte, simplório, porém eficiente. |
Por conta da censura imposta pelos empresários do selo da Megaforce, o título METAL UP YOUR ASS foi vetado, provocando o surgimento do título em
questão. Foi uma retaliação, surgida assim que Cliff proferiu algo com relação a decisão da gravadora. Produzido
por Paul Curcio, com participação
executiva de Jon Zazula, o álbum foi
gravado e mixado no estúdio Music America, em Rochester, Nova Iorque, em Maio
de 1983, sendo lançado no dia 13 de Julho do mesmo ano. A bolacha apresentava
uma velocidade fora do comum, vista apenas nas bandas punk e no MOTÖRHEAD,
contudo com uma musicalidade diferente, mais melódica. Herança das bandas
inglesas cultuadas pelos rapazes, demonstrada principalmente no sincronismo das
guitarras gêmeas de Kirk e James, além da pegada suingada de Cliff. Lars não deixava por menos e marretava o seu kit de forma cruel.
Nos pouco mais de cinquenta minutos que se seguem, as faixas MOTORBREATH, WHIPLASH, NO REMORSE, JUMP IN THE FIRE, PHANTOM LORD e METAL MILITIA
dão uma aula de amor ao Heavy Metal,
apresentando uma verdadeira ode ao estilo. O peso do som é contagiante, não
perdendo o pique do início ao fim. Ao passo que a primeira faixa, HIT THE LIGHTS mostra uma velocidade
absurda, engatando riffs furiosos de Kirk em perfeita harmonia com as batidas
de Lars, o mundo conhecia uma
sonoridade nova, mais cheia de atitude, que cuspia as notas num turbilhão
incessante. Era impossível conter a ira do thrash
metal, que veria a partir daquele estopim o surgimento de vários
representantes do estilo, primeiramente nos Estados Unidos, partindo então para
todos os continentes do mundo. (ANESTHESIA)
– PULLING TEETH mostra uma introdução de baixo de mais de um minuto e meio,
onde Cliff desfila toda sua
capacidade. Sem dúvida um momento ousado e inspirado. Já SEEK AND DESTROY mantém uma base sonora que simplesmente é a cara
do METALLICA! Não ouvi nada do mais
recente trabalho da banda, DEATH MAGNETIC,
mas acredito que pelo menos uma coisinha dessa faixa está lá, de uma forma ou
de outra. É o traço genético do grupo.
De todas as músicas aqui apresentadas, uma merece destaque
especial: a segunda faixa do álbum regular, THE FOUR HORSEMEN. A canção já existia desde os tempos de Dave Mustaine na banda, mas com o nome
de MECHANIX. Após a demissão de Mustaine, a banda implantou algumas
modificações, que resultaram na versão usada regularmente pelo METALLICA. Por que pelo METALLICA? Simples: Na condição de
coautor da música, Mustaine, que mal
voltara para São Francisco após todo o ocorrido de sua expulsão tratou de
iniciar a sua vingança contra Lars e
companhia, montando sua própria banda, o MEGADETH.
Em seu primeiro álbum, intitulado KILLING
IS MY BUSINESS... AND BUSINESS IS GOOD de 1985, a faixa MECHANIX dá o ar da graça, mas em sua
versão original. Cabe ressaltar aqui que outras três faixas do debut do METALLICA contém a contribuição de Mustaine, porém o grupo tratou de creditá-las com o devido
respeito.
Com este disco, o METALLICA
dava o pontapé na explosão Thrash que
assolaria o mundo da música pesada, seguido por diversos grupos de igual
talento, porém sem a mesma sorte. Alguns voaram bem longe, como o próprio MEGADETH do insolente Mustaine, que ao lado de outras duas
grandes bandas Thrash norte
americanas, o ANTHRAX e o SLAYER, formaram o hoje tão cultuado Big Four. Outras ainda estão por aí,
propagado este gênero tão amado pelos metalheads.
Ao METALLICA ficou a honra de puxar
o carro durante aqueles primeiros anos do novo gênero, enquanto recebia os
créditos por ter saído na frente com tanta competência. Neste caso a roda foi creditada,
e todo mundo rapidamente associa o nome da banda não só quando se fala de Thrash, mas quando acende a luz do som
pesado em geral. Ah, e antes que eu me esqueça, o jogo entre Brasil e
Inglaterra acabou em 2x2 mesmo.
Só falta fechar a tampa e apertar o play! |
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